Arrascaeta e o cavalo da sorte

Arrascaeta vibra com a taça da Copa Libertadores da América (Foto: (Gilvan de Souza/Flamengo)
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Com apenas 2.450 habitantes, a pequena cidade uruguaia de Nuevo Berlin, situada às margens do Rio Uruguai, ocuparia apenas 3,1% da capacidade do Maracanã.

Se te falta tamanho para preencher as arquibancadas do cartão-postal do Rio de Janeiro, é na história do seu filho ilustre, o meia Giorgian de Arrascaeta, que Nuevo Berlín estará para sempre enraizada no templo sagrado do futebol.

Nascido na cidade, outrora um assentamento de imigrantes alemães no século 19, o Arrasca, como é carinhosamente chamado pela nação rubro-negra, firmou um compromisso com a bola desde cedo. 

Batizado em homenagem ao cavalo da sorte de seu pai, um jóquei que nunca perdeu uma corrida enquanto teve Giorgian, o equino, ao seu lado, Arrascaeta provaria através do seu talento que a diferença entre o que é sorte e o que é destino.

Primeiro trotes

Já aos 4 anos, o pequeno Arrasca encontrou seu primeiro time: o Pescadores Unidos, clube da sua cidade natal. Ainda dividido entre a bola e a sela, foi através de um infortúnio familiar que Arrascaeta teve seu destino selado. Ao presenciar uma queda do pai, que culminou em uma fratura de braço, o uruguaio decidiu que seria através dos seus pés, e não as patas de um cavalo, que selaria sua glória.

(Foto: Arquivo Pessoal)

Ciente do talento do filho, Alfredo, pai de Arrascaeta, quase foi à falência por conta de um esquema pensado para estimular a dedicação do jovem às chuteiras. Em entrevista para o Globo Esporte, o patriarca contou que premiava o agora jogador do Flamengo com 5 pesos uruguaios para gol marcado nos torneios locais. O esquema foi abandonado após o jovem craque marcar 49 gols em uma única competição. “Tive que ganhar mais corridas e vender mais pães para pagar o Giorgian”, conta Alfredo.

Após se destacar nos torneios locais e em um torneio municipal no qual defendeu a seleção do estado do Rio Negro, Arrascaeta decidiu buscar seu lugar ao sol no futebol profissional. Após ser reprovado no Danubio, o jovem de 15 anos assinou com o Defensor Sporting em 2009.

Arrascaeta com a camisa do Defensor Sporting (Foto: Defensor Sporting/Divulgação)

A estreia na equipe profissional veio 3 anos depois, quatro meses antes do seu aniversário de 18 anos. Com boas exibições e constantes aparições no time titular, Arrascaeta conquistou o Torneio Clausura em 2013 e fez parte do elenco que caminhou até as semifinais da Libertadores de 2014, um feito inédito na história do time.

Logo o talento do uruguaio atraiu interessados e o Cruzeiro, atual campeão brasileiro à época e clube contra quem jogou no torneio sul-americano, contratou Arrascaeta em 2015 com um contrato firmado por cinco temporadas.

O sucesso no Brasil

Cérebro e maestro da equipe mineira, Arrascaeta não encontrou dificuldades para se adaptar ao futebol brasileiro. Com grandes atuações durante os quatro anos em que vestiu a camisa da Raposa, o meia conquistou o Campeonato Mineiro de 2017 e o bi-campeonato da Copa do Brasil, em 2017 e 2018.

Arrascaeta com a camisa do Cruzeiro (Foto: Vinnicius Silva/Cruzeiro Esporte Clube)

Graças ao desempenho, Arrascaeta protagonizou a venda mais cara do futebol brasileiro até aquele momento ao se transferir para o Flamengo em 2019 por 15 milhões de euros (R$ 63,7 milhões na cotação da época).

Com a camisa rubro-negra, Giorgian mostrou que o nome que lhe fora dado, por ser sinônimo de sorte, era mesmo predestinado. Já nos seus primeiros meses, o armador foi fundamental na conquista do Campeonato Carioca daquele ano. 

Peça-chave do histórico Flamengo de Jorge Jesus, o meia contribuiu ainda para a conquista da Libertadores e do Campeonato Brasileiro com 18 gols e 19 assistências na temporada. Se isso já seria suficiente para cravar seu nome na história de um dos maiores clubes do mundo, Arrascaeta, assim como o jóquei tatuado sobre um cavalo que leva na perna direita, nunca parou de correr em busca da glória.

Um nome na história

Desde então, o uruguaio passou a empilhar taças e se tornou um dos maiores vencedores da história do Flamengo ao conquistar três Campeonatos Cariocas (2019, 2020 e 2021), duas Copas Libertadores da América (2019 e 2022), dois Campeonatos Brasileiros (2019 e 2020), duas Supercopas do Brasil (2020 e 2021), uma Recopa Sul-americana (2020) e uma Copa do Brasil (2022).

Arrascaeta com a camisa do Uruguai (Foto: Divulgação/AUF)

O meia também segue escrevendo história pela Seleção do Uruguai, por quem disputou 42 jogos e marcou 10 gols, incluindo 2 na Copa do Mundo de 2022.

Individualmente, Arrascaeta foi três vezes eleito para a Seleção do Campeonato Brasileiro (2018, 2019 e 2022), ganhou três Bolas de Prata nos mesmos anos, foi três vezes eleito para a Seleção da Copa Libertadores da América (2019, 2021 e 2022), três vezes escalado para a Seleção ideal da América do Sul pelo jornal El País (2019, 2021 e 2022), ganhou uma Bola de Ouro da Copa do Brasil em 2022, entre vários outros prêmios.

Se tivesse que dar 5 pesos uruguaios para cada conquista do filho, Alfredo Arrascaeta provavelmente já teria gastado todas suas provisões. O que não seria motivo de nenhum arrependimento ou surpresa. Ao batizar seu filho com o nome do cavalo com o qual ganhou tantas corridas, Alfredo não jogou na sorte. Escreveu destinos!

O Flamengo agradece.