Gabigol e o sonho da Glória Eterna

Gabigol abraça a taça da Libertadores (Foto: Gilvan de Souza/Flamengo)

Quem diz que um raio não cai duas vezes no mesmo lugar, não conhece a história de Gabriel Barbosa. Nascido para justificar o apelido que carrega, Gabigol mostrou com a camisa do Flamengo o que sempre lhe fora predestinado.

Filho do fim de agosto, popularmente conhecido como o mês do azar, Gabriel Barbosa Almeida desafiou a superstição alheia e abraçou desde cedo aquilo que enquanto uns chamam de sorte, para ele era destino.

Pinola falhar no domínio? Sorte. A bola se oferecer carinhosamente para Gabigol escrever história? Destino!

O início

Vindo de um dos maiores celeiros de talentos do mundo, Gabigol chegou ao Santos após mostrar sua maior virtude: a capacidade de balançar as redes adversárias.

Em amistoso contra a equipe paulista pelo time de futsal do Santa Cecília, Gabigol assombrou os olheiros do clube ao marcar todos os  seis  gols em uma vitória por 6×1 contra o time santista. A partir daí, a história de amor entre Gabi e o Gol passou a ser escrita.

O talento era tanto, que a diretoria do Santos, ciente de que não poderia deixar escapar o fenômeno, ofereceu um salário e um apartamento para que Gabigol, ainda com 8 anos, e família deixassem São Bernardo do Campo e fossem morar na cidade praiana.

Só na base do clube, estima-se que Gabriel tenha marcado mais de 600 gols, o que o fez ser convocado para todas as seleções de base do Brasil e chegar a ser avaliado em 50 milhões de euros antes mesmo de estrear profissionalmente.

Santista de berço, Gabigol sempre teve intimidade com a bola / Foto: Divulgação

Como se fosse profecia, o Flamengo firmou sua parte na história daquele que viria a ser um dos seus maiores ídolos  ao ser o primeiro clube que Gabigol enfrentou como profissional em 2013, em um empate por 0 a 0 que marcou também a despedida de Neymar, que se transferiria para o Barcelona.

A baixa minutagem no seu primeiro ano na equipe principal não permitiu que Gabigol deslanchasse, o que veio a acontecer em 2014, aos 18 anos de idade, quando marcou 21 gols na temporada.

A partir daí, um boa sorte para quem quisesse parar o atacante. Gols em profusão feitos no Santos o levaram a Europa, onde teve passagens apagadas por Internazionale, que o contratou por 30 milhões de euros, e Benfica. 

De acordo com o próprio atacante, a dificuldade em se adaptar tão novo a uma outra cultura e alguns problemas internos do clube de Milão minaram seu desempenho e a decisão de voltar ao Santos parecia a escolha certa.

De volta ao começo

Após a passagem frustrada pela Europa, o filho pródigo retornou para a casa. Ainda mais letal do que na sua primeira passagem,Gabigol conquistou a artilharia da Copa do Brasil e do Campeonato Brasileiro de 2018, tendo se tornado ainda o maior artilheiro do Santos na década.

Com o alto custo financeiro para manter o jogador tirando o clube paulista da jogada, Gabigol foi emprestado em janeiro de 2019 ao Flamengo em uma operação que demandaria o pagamento integral dos salários do atacante: 3,5 milhões de euros (cerca de R$ 15 milhões) por ano.

Apresentado com a camisa 9, Gabigol credenciava-se como um reforço de peso, mas nem o mais otimista dos torcedores do rubro-negro conseguiria imaginar como em tão pouco tempo o atacante cravaria o seu nome na galeria de imortais do Flamengo.

Gabigol completa 100 gols no Brasileirão (Foto: Marcelo Cortes/Flamengo)

Santista desde criança, Gabigol chegou a admitir que jamais imaginaria vestir a camisa de um outro clube no Brasil e contou que foi a Nação rubro-negra que o fez mudar de ideia.

“Nunca imaginei que jogaria em outro time no Brasil, mas se tivesse um que eu quisesse jogar era mesmo no Flamengo. Quando surgiu o Flamengo, eu disse ‘C*, eu vou jogar no Flamengo, que bagulho f*’. Deu muito (frio na barriga). Com todo respeito às outras torcidas, mas a do Flamengo é diferente”, disse durante entrevista no Podpah.

A glória eterna

Ainda que seja santista, foi mesmo no Flamengo que Gabriel nasceu para brilhar. A camisa 9, armadura de tantos craques na história do clube, parecia ter sido moldada para ele.

Campeão carioca e vice-artilheiro da competição, Gabriel conquistava cada vez mais a torcida, principalmente após virar peça vital do time que encantou o Brasil: o Flamengo de Jorge Jesus.

Foi a partir dali que o atacante virou o destruidor de finais. Com gols em todas as fases de eliminatórias da Libertadores, 2 contra o Emelec, 1 contra o Inter e 2 contra o Grêmio, Gabigol fazia reviver o sonho da Glória Eterna.

Acostumado a vencer, o Flamengo tinha o incômodo de empilhar campanhas frustrantes na Copa Libertadores da América. E mesmo com o título brasileiro bem encaminhado, e que veio a se confirmar posteriormente, a obsessão estava nela.

E é aí que a vida se revela. Existem acontecimentos tão mágicos e que mexem tanto com a capacidade humana de acreditar, que parecem ter sido escritos previamente. Roteiros tão inimagináveis, e que se desvelam com tanta exatidão, que só podem ter sido tecidos pelas mãos do destino.

Não foi acidente ou mero acaso. Foi exatamente o que deveria acontecer.

Seja no Monumental, na frente da sua tv ou com o ouvido colado no radinho, a certeza que fica é que naquele dia, todo flamenguista se sentiu perto de Deus.

Foram 3 minutos de distância entre a agonia e o êxtase percorridos através dos pés dele, Gabriel Barbosa. Foram 38 anos entalados que terminaram com o grito de que sim, o Flamengo novamente conquistava a América.

Três anos depois, com outras 6 taças no caminho, o feito se repetiu e a história foi reescrita. O Flamengo conquistava a América a partir dos pés dele, uma outra vez.

Ao longo do curso do tempo, a história foi forjada a partir dos feitos de homens e mulheres que, de uma forma ou de outra, escreveram seu nome em letras de tinta, suor ou sangue.

Se em Lima, Gabigol já tinha escrito seu nome na eternidade, em Guayaquil ele se tornou imortal.