Na visão de Milly Lacombe, a vitória do Fluminense sobre a Aparecidense por 1 a 0 na Copa do Brasil expôs sintomas daquilo que ela define como a “falência do futebol”. O placar mínimo não impediu que o jogo se tornasse, para a colunista do UOL Esporte, uma amostra dolorosa da forma como o esporte tem sido sufocado por uma cultura que valoriza apenas o resultado, em detrimento da experiência emocional e simbólica.
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Conforme destacou Milly, o time carioca dominou amplamente a partida em termos de volume ofensivo — foram quase 30 finalizações, muitas delas com perigo —, mas enfrentou a resistência de uma defesa bem postada e determinada da equipe goiana.
No entanto, mesmo diante do esforço coletivo, a arquibancada, com público reduzido a apenas oito mil torcedores no Maracanã, respondeu com vaias. Para a jornalista, isso revela um descompasso profundo: “O time estava jogando, atacava, criava, levava perigo. O que estavam vaiando?”, questionou.
A colunista argumenta que a relação atual dos torcedores com o futebol está deformada por uma lógica de cobrança contínua por performance e vitória. “Não aceitamos mais perder, não respeitamos mais o esforço que não seja eficiente. Desempenho, performance, vitória. Conceitos neoliberais, perversos, desumanos”, escreveu, defendendo um resgate do amor pela camisa, pelas cores, e não apenas pelos três pontos.
Ainda segundo Milly, o esvaziamento do estádio é um reflexo direto da elitização do acesso ao futebol. Ela aponta a política de preços como impeditiva para grande parte da população, e sugere alternativas: “Por que não promover ingressos para pessoas de baixa renda? O que impede que gastemos tempo tentando reunir ideias para lotar o estádio?”, questionou, sugerindo uma reconexão entre o clube e o povo.
Ao mesmo tempo, enquanto parte da análise tradicional vê um time que tentou, atacou e venceu, Milly enxerga algo mais profundo: uma cultura esportiva que sufoca o lúdico. Para ilustrar, ela narrou o gesto de um maratonista que, próximo da linha de chegada, parou para dançar ao som da música, renunciando ao cronômetro para viver o momento.
“Ele deu sentido à maratona dele. Parou e dançou. Sentiu. Viveu. Fez contato com quem estava do lado de fora”, refletiu, fazendo um paralelo com o futebol atual que, em sua avaliação, perdeu justamente essa conexão com o sentir.
Em contraste com a perspectiva emocional e crítica da colunista, a análise técnica da partida destacou o volume ofensivo do Fluminense, mas também apontou limitações. O time de Renato Gaúcho manteve domínio territorial, mas falhou nas finalizações e na criação de oportunidades claras. A saída precoce de Cano, com menos de 10 minutos, afetou a efetividade ofensiva. Arias, por sua vez, teve atuação abaixo do esperado, errando muitos passes.
Apesar da vitória, a atuação gerou desconfiança e não convenceu parte da torcida. As chances desperdiçadas por Keno e Freytes, além das investidas frustradas em bolas paradas, revelaram um time que ainda busca solidez. O gol solitário, embora decisivo, não foi suficiente para apagar a sensação de que o desempenho ficou aquém do necessário para enfrentar desafios maiores adiante.